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Tirar Previdência da Constituição ainda é a principal ameaça da ‘reforma’ aos direitos dos aposentados

”40 anos de contribuição exigidos pela reforma para que o trabalhador alcance a aposentadoria integral é absolutamente inviável para a maioria dos brasileiros”, alerta o economista Eduardo Fagnani. 

“Ninguém vai ter aposentadoria integral no Brasil”, alerta o professor.

Apesar das mudanças realizadas pelo relator da reforma da Previdência, deputado Samuel Moreira (PSDB-SP), graves ameaças aos direitos dos trabalhadores ainda permanecem no documento apresentado nesta terça-feira (2) à comissão especial. A questão mais grave, segundo o professor do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Eduardo Fagnani é a desconstitucionalização dos critérios de acesso às aposentadorias. “A coisa continua complicada, não vejo motivo para baixar a guarda e achar que está tudo bem. Tem muitos problemas ainda pendentes”, disse o professor

Fagnani explica que, pelo parecer do relator, apenas a idade mínima de aposentadoria de 65 anos para os homens e de 62 anos para as mulheres constará na Constituição Federal. Todos os demais critérios de acesso aos benefícios serão definidos posteriormente por lei complementar.

A diferença é que, para ser aprovada, uma alteração à Constituição necessita do apoio de 3/5 dos deputados (308 votos), em duas votações. Já alterações por lei complementar exigem apenas a maioria absoluta (metade mais um, ou 257 votos) dos parlamentares, também em dois turnos, o que possibilita que as regras das aposentadorias venham a ser mais facilmente alteradas no futuro.

Tempo de contribuição

Segundo Fagnani, os 40 anos de contribuição exigidos pela reforma para que o trabalhador alcance a aposentadoria integral é absolutamente inviável para a maioria dos brasileiros. Ele cita estudo realizado pela economista Denise Gentil para a Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Anfip) que aponta que, em média, o trabalhador brasileiro contribui para a Previdência por cinco meses a cada ano, devido à alta rotatividade, o desemprego, dentre outras questões. Para alcançar os tempo de contribuição exigido, seria necessário trabalhar por mais de 80 anos. “Ninguém vai ter aposentadoria integral no Brasil”, alerta o professor.

Até mesmo o tempo mínimo de 20 anos de contribuição para homens (15 anos para mulheres) será difícil de ser alcançado, pois seriam necessários 48 anos trabalhados, segundo a média revelada pelo estudo, o que inviabiliza também a aposentadoria parcial correspondente a 60% do valor da salário recebido na ativa.

Institucionalização do déficit

O economista também afirma que o parecer do relator da “reforma” da Previdência “desorganiza” e “desfigura” o orçamento da Seguridade Social. Hoje, a Seguridade Social – que inclui as áreas da Saúde, Previdência Social e Assistência Social – tem formas de financiamento integradas, conforme previsto na Constituição. O que se quer agora é a segregação das contas dessas áreas. O resultado, com a introdução do caráter exclusivamente contributivo da Previdência, é o fim do regime tripartite de financiamento. As aposentadorias passarão a serem financiadas apenas com a contribuição de empregados e empregadores, sem a participação do Estado, através de outras fontes de financiamento.

  • fonte: Rede Brasil Atual
  • foto capa: Folha de S.Paulo

Comissão especial da Previdência conclui leitura e tenta votar relatório da ‘reforma’

Relator complementou seu parecer, sem mudança significativa e excluindo estados e municípios. Votação pode ocorrer nesta quarta ou quinta

A comissão especial da Câmara dos Deputados que discute a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 6, de “reforma” da Previdência, conseguiu enfim concluir a leitura do parecer do relator, Samuel Moreira (PSDB-SP), com algumas alterações ao texto original. Durante a sessão desta terça-feira (2), a oposição tentou obstruir e retirar o projeto da pauta. O próximo passo é a leitura do relatório, que pode ocorrer amanhã ou quinta-feira. A PEC tem 109 destaques, sendo 85 individuais e 24 de bancadas. Depois disso, a fase seguinte é o plenário da Casa, em dois turnos, com a bancada governista tentando viabilizar a votação ainda em julho, antes do dia 18, início do recesso legislativo. Passando, a PEC vai para o Senado.

Na primeira parte da sessão da comissão especial, presidida por Marcelo Ramos (PL-AM), a deputada Luiza Erundina (PSB-SP) apresentou requerimento pela retirada do projeto da pauta. Partidos da oposição se juntaram pela obstrução, enquanto governistas e “independentes” (como MDB e PSDB) conseguiram derrubar o requerimento. Foram 32 votos a 13 pela continuação da tramitação. O governo manteve o discurso e apresentou a “reforma” como uma espécie de redenção do país, enquanto a oposição voltou a alertar para prejuízos, principalmente, à população mais pobre.

A leitura da complementação do relatório começou às 18h33, “sem alterações significativas no conteúdo”, como adiantou logo de início o próprio Moreira, e durou 22 minutos. Durante a tarde, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia(DEM-RJ), reafirmou que a ideia é votar a PEC no plenário na primeira ou na segunda semana deste mês, com a comissão especial votando o relatório do tucano até a próxima quinta-feira (4). Depois disso, poderia ser instalada outra comissão, para analisar a “reforma” tributária (PEC 45), criada em 17 de junho. Ramos disse que a equipe econômica “revisou” cálculos e concluiu que a proposta, como está, garantiria economia de R$ 1,01 trilhão em 10 anos.

Segundo o relator, o texto “manteve uma estrutura central, de idade mínima, de novas regras de cálculo” para aposentadoria e pensão e “também teve ganhos sociais fortes”, com a saída de itens como Benefício de Prestação Continuada (BPC) e dos trabalhadores rurais. “Precisamos caminhar evitando a criação de regimes próprios e públicos de previdência”, afirmou, quase no final da sessão, vislumbrando um regime único no futuro. Ele não descartou a retomada, mais adiante, de uma discussão separada sobre o sistema de capitalização, defendido pelo ministro da Economia, Paulo Guedes. “Eu acho que quem está no mercado de trabalho tem mecanismos garantidos de transição”, disse Moreira. Para ele, a reforma vai dar condições para o governo de fazer o país crescer e retomar os empregos. “Mas depende de um plano de governo.”

A proposta do governo para a Previdência prevê idade mínima de aposentadoria de 65 anos para os homens e de 62 anos para as mulheres. No caso das professoras da rede pública, o relator reduziu a idade mínima de 60 para 57 anos. Para servidores, as idades seriam de 61 (homens) e 56 anos (mulheres), subindo para 62 e 57, respectivamente, em 2022. Deputados ligados à área de segurança pública protestaram contra o que consideram tratamento diferenciado. Em protesto, parlamentares chamaram Jair Bolsonaro de “traidor”.

O tempo mínimo de contribuição foi fixado em 20 anos, mas o relator reduziu para 15 no caso das mulheres. Ainda pela proposta, estão previstas três regras de transição para aposentadoria por tempo de contribuição no setor privado. Haveria um outra para os servidores públicos. Estados e municípios ficaram de fora, mas esse tema pode voltar no plenário. Uma reunião hoje entre Maia, líderes partidários e governadores terminou sem acordo.

“A oposição não nega a necessidade de ajustes na Previdência para garantir sua sustentabilidade”, afirmou o deputado Alessandro Molon (PSB-RJ), elogiando o relator ao acolher o pedido de não retirar recursos do BNDES, que perderia arrecadação do PIS-Pasep. Mas ele acrescentou que o projeto ainda prejudica aqueles que trabalham mais e ganham menos. “A proposta do governo é socialmente irresponsável”, criticou.

Já o deputado Henrique Fontana (PT-RS) deu o exemplo de um trabalhador da construção civil com 62 anos e 20  de contribuição, que poderia se aposentar recebendo em torno de R$ 2.000. Mas perderia aproximadamente metade desse valor “se passarem essa regra cruel, draconiana e injusta”.

A líder do governo no Congresso, deputada Joice Hasselmann (PSL-SP), disse que apesar das mudanças foi mantida a “espinha dorsal” da proposta. E voltou a defender um sistema de capitalização, que chamou de “poupança garantida”. Completou dizendo que quer ver “8 milhões de empregos” criados até 2023, no país pós-reforma.